Ah, os números…
Para uns, eles representam tudo de pior que a internet já criou. Causam comparações e perturbam o fazer artístico com preocupações que deveriam ser relegadas aos marketeiros e aos contadores.
Para outros, são o Santo Graal, o objetivo definitivo. Tornam os sonhos possíveis, trazem autoridade e separam quem já tem estrada de quem não faz ideia do que está fazendo.
Eu entendo os dois lados. Trabalhei por muito tempo produzindo conteúdo na internet, tanto para projetos pontuais quanto para outros mais de longo prazo. Depois, eu me voltei ao UX Writing, criando produtos digitais. Então, eu fui obrigado a lidar com os números e com pessoas querendo ver números. E, se tem algo que ficou bem óbvio por meio dessa experiência, é que tem muita gente que chama de “foco em dados” o que é pura e simples ansiedade.
Por mais bem intencionada que a pessoa esteja, no fundo, o que se quer é uma forma de pular etapas, crescer da noite pro dia ou, no mínimo, sinais de que esse negócio de criar na internet não é só um desperdício de tempo.
Não é à toa que, independente se são positivos ou negativos, os números seguem causando rebuliço. Seja deixando os autores bêbados de si quando rola um pico, seja tirando o sono, quando eles caem.
Mas a verdade é que engajamento em redes sociais são como os índices do mercado de ações. Geram um pensamento de extremo curto prazo e, muitas vezes, quando são levados em consideração na hora errada, mais atrapalham do que ajudam.
Parece que temos um exemplo disso rolando. Recentemente, começaram a aparecer trocentas reclamações pelo Notes e até na minha caixa de entrada, tentando entender o que está acontecendo com o Substack. Parece que todo mundo está passando por um desses momentos onde algo misterioso mudou e os números fizeram a pior coisa que eles poderiam fazer: cair.
As reações são o que se espera: gente dizendo que vai desistir, que perdeu a oportunidade, que o Substack só valoriza o Notes, que a culpa é da nova função de Reels…
No meio dessa confusão, decidi aproveitar o espaço que me cabe e trazer um pouco do que aprendi sobre métricas na produção de conteúdo ao longo dos anos, cruzando com os estudos que venho fazendo da plataforma nos meus momentos de nerdice e, claro, uma abordagem que eu faço e que acho que vale se você tem um projeto criativo online e não quer enlouquecer recaindo no discurso puramente marketeiro.
Vou explicar evitando de propósito termos técnicos aqui. Então, você não vai me ver falando em KPIs, OKRs, Bounce Rates, CTR, CAC, LTV, funil de conversão, taxa de churn, taxa de abertura, jornada do usuário, segmentação, cohort analysis, nem nada disso.
Hoje a proposta não é te transformar num analista de dados, mas sim, conversar um pouco sobre como abordar os números, interpretar os sinais sem cair na obsessão e, claro, manter a vontade de criar quando os gráficos começam a descer.
Nesse texto vai ter um pouco sobre:
- Não focar em números no primeiro ano
- O básico das métricas
- Como olhar os números e analisar tendências
- Evitar comparar seus números com os do coleguinha
- Uma coisa que ninguém gosta de ouvir
- Outros textos sobre o Substack
Regrinha: você nem deveria olhar pros números no primeiro ano da sua newsletter
Ok, todos odeiam regras.
Mas deixa eu explicar o racional aqui.
Sim, é óbvio que um ano é um número mais ou menos arbitrário, mas tem motivo: quando a gente começa, a vontade de ficar olhando os números é irresistível. Você fica lá atualizando a página, pra ver se chegou algum like, se alguém comentou, se compartilharam, se leram… e quando não acontece, você pode ter variações do tema “eu sou horrível e vou desistir porque não tenho incentivo para continuar”. Só que, no começo, nada acontece mesmo. E o começo é um loooongo período.
Ninguém fala disso e eu não sei o porquê. Mas vou falar: o primeiro ano da sua newsletter não é pra crescer, é pra criar o corpo de trabalho. Sem material o suficiente pra uma pessoa passar uma tarde vendo tudo que você produz, não tem como demandar que essa pessoa te acompanhe, faça uma assinatura paga ou compre algo de você.
Newsletter não funciona como Instagram ou TikTok, cujo foco é falar pro máximo possível de gente. Aqui, o ponto é falar pra uma quantidade suficiente de pessoas de forma profunda. Você está fora das redes sociais da Meta. A pessoa que te acompanha passa 10 ou 15 minutos te lendo, ouvindo suas ideias. Às vezes, ela reserva uma manhã para ler um acumulado das coisas que você publicou. Depois, ela te manda uma mensagem no inbox, contando que a namorada voltou a costurar por causa de um texto que você escreveu. Entende a diferença?
Foco no contato profundo, em possibilitar que alguém passe tempo junto com você. Pensa numa livraria… não é legal quando você pode só ficar por lá, folhear, ver o que agrada? O livreiro vem, bate um papo, indica umas coisas, manda você sentar pra ler… É um contato lento… você pede um café e, no final, você acaba gostando tanto do que vê que sai com uma pilha de livros. Newsletter é por aí.
Apesar do nosso desejo por uma ascensão meteórica, a verdade é que relações demoram para se estabelecer. Principalmente a relação entre um criador e a comunidade. Mas pouca gente está disposta a fazer o que precisa.
Um estudo da Reletter de 2023 mostra bem como newsletter é um jogo de consistência. Na época, eles mapearam 1,7 milhão de newsletters hospedadas no Substack e no LinkedIn e só 12% delas eram ativas (uma publicação nos últimos 45 dias).
Agora a paulada da linha de corte:
- Só 35% chegaram na 2ª edição;
- E só 5% das newsletters chegam a 21 edições.
Então, ouve o que eu estou te dizendo: esse é outro universo, com outras regras. Está começando? Foca em ter trabalho publicado.
No primeiro ano, sua métrica de vitória é atravessar o deserto e dar material suficiente para alguém devorar seu trabalho.
Não interessa, eu quero números (ou: o básico das métricas)
Ok, então. Lá vai o basicão dos números.
Vamos considerar que você já atravessou o deserto. Tem mais ou menos um ano de publicação, uns 30 ou 40 textos, reuniu um número razoável de novos assinantes. Agora, sim, está na hora de otimizar as coisas.
Então, você abre o painel e tem lá um monte de métricas que importam pro Substack. Número de pagantes, renda anual, total de assinantes, o tanto de assinantes que eles passam pra você pelo app, visualizações dos últimos 30 dias e taxa de abertura dos últimos 30 dias.

O Substack também tem um indicador embaixo, que serve pra sinalizar se você está subindo ou descendo — o código de cores é interessante, eu quase consigo ver a reunião onde eles dizem que é melhor deixar o elemento cinzinha ao invés de vermelho, pra não alarmar ninguém.
Normalmente, as pessoas ficam obcecadas pela taxa de abertura e pelo número de novos assinantes. Mas não é porque todo mundo olha pra eles que eles são a melhor forma de se orientar.
Por exemplo, se você escreve para converter em vendas, ter novos assinantes é legal, mas é no calor da conexão e no valor que você traz para o relacionamento que as pessoas vão passar a comprar de você. Novos assinantes, normalmente, estão colocando o pezinho. Eles importam, mas seu objetivo é vender. Logo, sua métrica central, a sua “Estrela do Norte” (ou North Star) é a conversão em vendas.
É claro que você pode argumentar que, se você mantivesse a mesma taxa de conversão, mas tivesse novos assinantes, isso resultaria em mais vendas. Mas como eu disse… tudo depende do que você está buscando. Nesse caso, sua Estrela do Norte mudaria de lugar e se tornaria crescer seus assinantes gratuitos.
Ou seja, o “número certo” depende do objetivo, do contexto, da estratégia.
(Parece que eu estou escrevendo no LinkedIn, né? Foi mal. rs)
Uma pessoa que está mantendo uma newsletter porque quer só compartilhar sua escrita, talvez devesse focar exatamente nisso, sem arrancar os cabelos quando algo sobe ou desce. Nesse caso, o objetivo é acumular textos, ou seja, sua Estrela do Norte é a quantidade de textos publicados.
Talvez você esteja querendo fortalecer a sua comunidade. Provavelmente, sua Estrela do Norte seria o número de comentários.
Enfim, sem saber para onde você quer ir, os números são só vaidade. Então, o toque é: evite determinar muitos objetivos e evite querer que todas as métricas cresçam ao mesmo tempo. Se você quer olhar os números, foque na sua Estrela do Norte, delimite ações correspondentes e não se distraia.
Como olhar os números (analisando tendências)
Você determinou a métrica que vai ser sua Estrela do Norte, aquela que melhor serve aos seus objetivos. Mas aí, fica acompanhando tudo que acontece, sorri quando ela sobe e chora quando ela cai, numa montanha-russa de emoções.
Eu já fiz isso inúmeras vezes, sei como é. Mas uma única publicação não define o seu projeto, nem a sua competência como escritor, pintor, videomaker, etc. Cada texto vai ser recebido de uma forma diferente por motivos mais ou menos aleatórios.
Por exemplo, pode ser que a caixa de entrada esteja muito concorrida por causa de uma Black Friday ou outra ação comercial. Pode ser uma época na qual o seu público, em específico, está mais ocupado e não anda lendo muito. E, sim, pode ser que você tenha entrado numa temporada de falar sobre algo que seu público não está interessado — não é o fim do mundo, acontece.
Ainda assim, quando decidir abordar seu painel, o ideal é não observar números de forma isolada. Sempre que pegar para analisar, foque em um recorte que permita observar tendências.
Eu, por exemplo, não analiso minhas publicações mensalmente. Cheguei à conclusão de que o ideal (pra mim) é analisar trimestralmente, pelo fato de que eu publico uma vez por semana — um mês tem só 4 ou 5 entradas de dados, é pouco pra entender a tendência. Olhando um recorte maior, fica mais fácil ver se a linha está mesmo subindo ou descendo ou se está só oscilando dentro do normal.
Um ponto de dados não define nada. Mas se você repetir as mesmas ações por um tempo e houver uma diferença que se repete de forma significativa, aí sim, significa que você fez algo que deu resultado. Vale analisar.
Evite comparar com os números do coleguinha
Eu até acho engraçado esse impulso. A gente olha o colega do lado, vê que a newsletter dele está crescendo 500 por mês, mas a nossa só cresce 200. Daí, a gente se sente horrível, acha que algo está errado.
Mas, do outro lado, tem alguém que cresce 50 e aí, a gente se empina, acha que está mandando bem e que tem todo potencial pra viralizar e vender milhões de livros.
Nada muda, só a soberba mesmo. 😅
Nesse universo das newsletters, é muito difícil traçar paralelos que sejam replicáveis. Uma mudança no tom e na personalidade do autor faz toda diferença. Só isso é o suficiente para que uma newsletter do mesmo tema atraia um público totalmente diferente.
Eu vejo escritores com redes menores, de 2k a 4k soltando posts com mais de 200 likes e 50 comentários, enquanto outros com mais de 12k ou 15k não chegam nem perto disso. Já vi alguns casos do autor ter público pequeno, mas ter o cobiçado selo de best seller.
Então, acho que varia muito do perfil da publicação, tipo de conteúdo gerado, o quanto a comunidade se identifica ao ponto de se manifestar… tem muitos casos e possibilidades. É difícil cravar uma média “da indústria” que não sirva só pra deixar todo mundo ansioso.
O ideal é você ter pontos de dados o suficiente para que seja possível entender o comportamento do seu público em relação com o seu conteúdo, não o de mais ninguém. A melhor forma de se analisar os dados de uma publicação não é olhando pro lado, mas sim, olhando pra trás.
Então, você acompanha como isso se desenrola ao longo do tempo, vê se tem uma média. Com isso, chega ao seu número, baseado no seu contexto. E aí, você decide se vai mudar algo pra melhorar esse resultado ou não, fica a seu critério.
Reforçando, o ponto mesmo é entender qual o sentido de perseguir uma determinada métrica. É importante entender que cada newsletter vai ter uma medida de sucesso diferente e, talvez, correr atrás do próprio rabo pra conseguir likes ou comentários nem seja interessante, sabe? 🙂
Ninguém quer ouvir isso, mas…
Quando estamos falando de métricas, todo mundo analisa e dá explicações mirabolantes, mas no final, o fato é que na maioria das vezes, o que faz o engajamento subir ou descer são movimentos mais ou menos aleatórios e fora do controle da pessoa que mantém o projeto.
Tem fatores que influenciam, claro — se você mudou algo nas suas publicações, se foi exposto a outras comunidades… mas sem variáveis muito bem delimitadas, fica difícil determinar o que fez a diferença.
Vou dar um exemplo: uma vez eu abri meu gráfico de assinantes aqui no Puxadinho e me perguntaram o que eu tinha mudado no meu projeto que fez ele começar a crescer bem mais rápido, de repente. Posso dizer com toda a convicção: não faço a menor ideia. Adoraria reivindicar algum insight genial, mas eu faço o que sempre fiz. Talvez a interface do app tenha me favorecido em alguma mudança… eu não sei.
Devo ter decepcionado com essa resposta, mas é a mais pura verdade.
Não é à toa que, se você aborda alguém mais experiente na produção de conteúdo, o que essa pessoa vai dizer é uma variação de “só continua”. É porque é real.
É experimentando novas abordagens, vez após vez, que você vai descobrindo o que funciona com a sua comunidade, mas principalmente, o que funciona com você. A sua voz vai se revelando. O que você tem a dizer também.
Todo mundo começa achando que é uma certa pessoa e que vai falar de um determinado assunto. Mas basta umas cinco publicações e ela vê que o assunto esgotou. Um tempo depois, ela vê que na real, tem muito a dizer sobre outra coisa e é aquilo que engata. Depois, ela muda de novo.
Produzir no longo prazo é um exercício de autodescoberta, que vai desembocar ou não em números melhores. Mas os números são um sintoma, um efeito desse processo. Não são a razão de tudo.
Outros textos sobre o Substack
Eu estou escrevendo uma série sobre o Substack, cobrindo alguns pontos que acho importantes para quem está começando. Se quiser ver mais, aqui os outros:
- Como começar no Substack: o que aprendi 100 newsletters depois
- Por que criar no Substack é tão bom (e tão ruim)
Além disso, estou montando um curso para quem está começando na plataforma. Se tiver interesse, pode entrar na lista de espera aqui, que eu te aviso quando sair.
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